O DIA DE CELEBRAR A HISTÓRIA

20 de setembro de 2024

 





Somos movidos por símbolos. Desde o nome que nos foi dado, passando por tudo que escolhemos para registrar nossa individualidade desde o nascimento, e chegando à identidade coletiva pelos símbolos que se representa. Na Constituição de cada país se define os símbolos da identidade nacional: a bandeira, o hino, a moeda.

Setembro é um mes especial. Neste mes estão as datas em que se celebra a história. O 7 de setembro é o Dia da Pátria, dia em que D. Pedro declarou a Independência do Brasil (1822). E o 20 de setembro é o dia da Pátria Farroupilha, dia de início da revolução que durou 10 anos, durante os quais o estado declarou sua independência como República Riograndense (1835/45). Costuma-se dizer , ufanísticamente, que para as duas celebrações se conta com bandeira, hino, e moeda - o real para todos os brasileiros e o pila dos gaúchos. 

A Revolução Francesa, que durou 10 anos (1789/99) derrubando a monarquia e instaurando a república, influenciou a bandeira do RS, com 3 cores e o lema: o verde da mata, o vermelho do espírito revolucionário, e o amarelo das riquezas. O lema da bandeira francesa é Liberdade, Igualdade, Fraternidade, e o da bandeira gaúcha é Liberdade, Igualdade, Humanidade. Franceses cantam a todo pulmão a Marselhesa, e os gaúchos o Hino Farroupilha. Que o digam pelos estádios de futebol e pela abertura de todos os eventos.

Pois desde a catástrofe que se abateu sobre o RS neste ano, mais um símbolo se fez presente para sempre: é o do buquê de girassóis. O nome dele é Solidariedade. Com o que aconteceu nas enchentes cabe na bandeira de todo o mundo. Enquanto se vivia a enchente, em cada fachada, torre, antena, camiseta, no manto para cobrir os resgatados, lá estava a bandeira do Rio Grande. Ao seu lema pode-se somar agora Solidariedade. Embora não escrita, paupável. Foi onipresente. 

Solidariedade é definida como um sentimento  que leva as pessoas a darem sem pedir nada em troca. Sentimentos foram o motor das ações nestas enchentes: o espanto, a dor, a sensação de impotência do ser humano frente ao desastre. O que é concreto, irrefreável, é o sentimento, que precisamos botar para fora, expressar em gestos, palavras, criação em todas as suas formas. E reagindo frente à impotência quando são alcançados pelo desastre, os humanos movem-se através da ação.

Um gigantesco movimento de voluntários foi se formando espontaneamente. Gente de todo o país e do mundo foi se organizando, numa imagem igual à formação das sinapses do cérebro em reação aos estímulos.  A ação dos voluntários gerou resultados em vidas, esperança, funcionando como alimento para o significado da vida. Imagens impactantes como a do cavalo Caramelo que ficou equilibrando-se por 3 dias num telhado – tudo o que restava acima do mar de água da enchente, viraram símbolos. Seu resgate foi registrado ao vivo.

A imprensa, no seu papel de cobrir eventos, entrevistou pessoas. Cada pessoa entrevistada, única, expressava o que sentia frente à catástrofe. E as imagens foram se encadeando pelas entrevistas, pelo registro em fotos, em vídeos, no grito do silêncio quando faltavam palavras, gerando uma construção. Gigantesca, tanto quanto o evento. O nome disso é Solidariedade. 

O desastre vem como um raio, luz sem palavras. Depois é que chega o trovão, um barulho que anda. No humano, o desastre deixa cicatrizes, que doem prenunciando o temporal. Quem ficou marcado pelo desastre sente.  O medo causado por um trauma sé memória que se expressa por muito tempo no comportamento dos seres vivos traumatizados, como o do cãozinho que, já no colo da pessoa que o estava resgatando, continuava batendo as patinhas como se nadasse. Ou no comportamento do outro cão que se agarrava às pernas da cuidadora no abrigo para onde foram levados milhares deles. No registro do cotidiano, como a transmissão ao vivo do resgate do cavalo Caramelo, se conta a História.

Face ao desastre, os voluntários (pessoas e instituições) organizam a resistência. Como numa guerra, vem a ação de abraçar o que sofre, registrar tudo em palavras, escritos, fotos e vídeos, buscar salvar tudo o que tem vida, pessoas, animais, tudo. Compartilhar. Chorar junto. Abraçar quem chora. Abraçar quem não consegue chorar. Abraço. “Vamos abraçar a igualdade” foi o nome que demos à campanha de 2000 à prefeitura de Porto Alegre para expressar o que propúnhamos para a cidade.  O Brasil Paralelo deu nome a um documentário, assim dando uma identidade a todo o evento de maio/junho: “O Resgate”. Quem viveu a catástrofe chora toda a vez que o assistir. O cãozinho que batia as patas no colo da resgatista já no bote de salvamento emociona sempre. A imagem tem esse poder, o de carregar as emoções sentidas. Palavras, músicas e desenhos também. O tipo de dor causado pela cicatriz que fica de cada evento é próprio. Ao pronunciar o nome, sente-se.

Por isso a importância do Desfile de 20 de setembro de hoje, quando desfilamos a nossa História: temos novos símbolos. O cavalo Caramelo é a Resistência. Os girassóis são a Solidariedade. Viva o 20 de setembro e viva a vida!

 

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